Centro

quinta-feira, 30 de junho de 2016

Ondas na superfície
Na esfera existencial
Todo ponto é um centro.

Cuidado

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Cuidar do corpo sem cuidar da mente é ignorância.
Cuidar da mente sem cuidar do corpo é negligência.
Mas cuidar de mente e corpo sem cuidar do coração, é sofrimento, é violência.

Ninguém

terça-feira, 28 de junho de 2016

Num mundo perfeito ninguém precisa lutar por direitos
Num mundo perfeito ninguém precisa lutar
Num mundo perfeito ninguém precisa
Num mundo perfeito ninguém.

Alma de poeta

segunda-feira, 27 de junho de 2016

Alma de poeta
é uma flor astral
que se desdobra para dentro e para fora.
Como todas as outras almas...

O tolo e o ouro

domingo, 26 de junho de 2016

ENCONTREI A TAL LÂMPADA MÁGICA!

Fazia uma caminhada. Hoje amanheceu frio. É bom pensar no frio (é bom pensar no calor também, mas caminhando acho melhor no frio). Aí avistei algo, um brilho que se destacava na areia da construção: era uma lâmpada, igual a do Aladdin! Juro!

Esfreguei, lógico. Todo feliz. Sujei a manga da malha. E nada de gênio. Me sentindo estúpido, quis arremessá-la para longe, mas podia dar um bom decorativo, então levei para casa. Lá chegando, fui lavar a peça. Todavia... Mergulhando-a na água, algo estranho: o bico da lâmpada começou a absorver a água, feito um ralo! Ficou mais forte, cada vez maior! Era um vórtex, algo sobrenatural. Puxava tudo, inclusive eu.

Uma grande espiral e acordei em outro lugar, só havia luz ao redor, não sei definir os tons. E uma voz se anunciou. Era grave como o rugido de um leão. Era o gênio! Disse que estávamos dentro da lâmpada e me ofereceu um desejo. Desejei ter três desejos, ele achou graça, mas não aceitou. Imagine minha situação... Todas as palavras do universo para escolher... Todos os problemas para sanar, as possibilidades.

O gênio batia o pé, estava inconformado com minha demora. Meu olho brilhava diante da dúvida. Até que me decidi:

- Gênio... Eu quero um sonho! Eu já nem tenho sonhado. Os dias são tão reais, tão sérios... Meu riso esmaeceu para baixo. O mundo não vai mudar com um desejo, e nem poderia eu viver num mundo ao meu agrado. O mundo é o que é! E eu... Eu só quero...

"Mas que sonho você quer? Fala de uma vez"! Me interrompeu o impaciente espírito.

- Quero o mesmo sonho todas as noites: estar em paz comigo e com todos os seres.

O gênio caiu de rir, mesmo não sendo físico. Disse que eu estava sendo ridículo, que nunca um pedido fora tão inutilmente desperdiçado... Se gabou de já ter parado exércitos, ter elegido grandes governantes etc etc. Me deu outra chance. " Pense bem... O que você realmente quer?", perguntou.
Foi aí que eu entendi que o gênio é quem não sonhava... Também, coitado, como poderia... Com toda aquela luz... Fiquei com poesia da situação dele. Então arrematei:

- Amigo, eu quero que tu sonhes. Que tenhas noites. E que cada sonho teu seja um sonho de paz de alguém do mundo.

Ele agradeceu. Bateu as mãos. Acordei debaixo do meu edredom. O dia estava frio... e pensei: "talvez fosse bom caminhar"...

Agora

sábado, 25 de junho de 2016

Mar no coração
Pensamentos
Nunca ancoram
Âncora no chão
Sentimentos
Que se afogam
Na vastidão
Partida e chegada
Saída e labirinto
Nada e imensidão...

Da gente; do bem

sexta-feira, 24 de junho de 2016

"DROGA. Lá vem o Paulo, esse canalha. Maconheiro! Um lixo com pernas". Pensou Dona Dida, dona da banca de jornal. Paulo vinha para casa, descendo a rua. Voltava de um dia de trabalho daqueles... Quando passou defronte a banca, fez um gesto à dona, Dida, que o acenou hipocritamente, balbuciando maldições por detrás dos grandes óculos e falso sorriso. "esse cabelo parece um ninho de rato...", "essa tatuagem é nojenta...", "esse rosto furado...". Ela seguiu o sorridente rapaz com o olhar, desaprovando-o por seja o que for.

Quando Paulo passou pelo Bar do Gorjeta, havia um homem maltrapilho caído, certamente ébrio até o osso da alma, com o olhar perdido (parecia opaco, sem brilho). Paulo o ofereceu atenção, foi verificar se podia fazer algo pelo homem. Sempre acreditou que as pessoas devem fazer umas pelas outras o que fariam por si mesmas. Mas nada conseguiu fazer, o homem sequer o ouviu. Dona Dida ainda o encarava com a boca torta, caindo em rangidas. "Olha lá, encontrou outro vagabundo como ele, aí eles se entendem", resmungou a velha, enquanto ajeitava a imensa lente dos óculos. Riu sozinha em escárnio, alto o suficiente para Paulo virar-se em sua direção e se perguntar o que de tão bom lhe ocorrera para rir assim tão satisfeita. Acabou rindo um pouco com ela. Entrou no bar, falou com o Sr. Gorjeta, apontando para o homem caído. O movimento ia começar, era anoitecer, Gorjeta pareceu interessado em ajudar, mas queria era tirar o espanta-freguesia dali. Sorriu ao Paulo, que pensou estar fazendo algo de bom e saiu, seguindo seu caminho, com os tantos olhares reprovadores pesando sobre suas costas.

A poucos metros de sua casa, Paulo encontrou Boné, um moleque muito magro, mas muito ágil, esperto. Um garoto de 13 anos que mora ali perto, na rua, numa 'invasão'... Sim, porque... Seres humanos invadem as terras em que nasceram... Ao caminhar pela pátria, exercendo seu direito constitucional, ao existirem, se forem pobres, estarão sempre invadindo, vilipendiando... Pensava a maioria naquela rua, nos prédios, comércios e casas que haviam nos 800 metros de rua que vinham do ponto de ônibus até a casa de Paulo.

Boné perguntou a Paulo se tinha alguma coisa para ele. Paulo gostava do garoto e sempre conseguia um agasalho ou chinelo, um livro, um bico, um trocado, um lanche etc. O que quer que conseguisse era muito, pois o avô de Boné era seu único familiar conhecido e estava morrendo em plena rua, ao alcance de tantas mãos tão fechadas, prontas somente para socos. Paulo não tinha nada dessa vez. O garoto saiu arrasado para o lado do avô, que tossia.

Paulo chegou em casa. Ninguém estava lá, coisa rara. "Ótimo!", pensou, e cumpriu o ritual: deixou a mochila na cama, tirou os sapatos e a camisa, vestiu uma bermuda no lugar da calça e abriu a gaveta. Pegou seu cigarro enrolado à mão. Foi para a porta dos fundos, ninguém reparava no quintal neste momento, então com destreza ele subiu no muro para ficar na mangueira. Nos galhos altos, acendeu. Respirava, enfim. A cidade sufocava, tudo era sempre cabal e difícil, definitivo, exceto estar ali, pensando em não pensar. Nunca conseguia, sempre acabava pensando. A erva o deixava encucado, formulava grandes perguntas para si mesmo e arriscava decifrar as respostas, queria encontrar uma forma de ficar mais sábio, se preocupava com o mundo.

Ficou fumando e não percebeu que sua família havia chegado. Voltavam do mercado, haviam comprado cerveja, estavam falando alto. Ele suou frio, apagou o cigarro, deixou-o escondido na árvore e desceu rapidamente, mas o pegaram no pulo... Com os olhos vermelhos.

Mais gritaria, os mesmo xingamentos, mais uma surra. Que vacilo bobo. Podia ter saído, não precisava ficar pensando na própria casa. "Maconha é uma merda, coisa de bandido", seu pai repetia agressivamente. E enquanto bufava acendeu um cigarro para se acalmar... Acabou fumando dois. Ele não sabia, mas ia morrer em dois anos e meio, por conta do câncer de pulmão que ainda não deu sinais.

Paulo sentiu-se envergonhado, queria sair, mas agora era impossível. O jeito era estudar, então abriu as apostilas. Ele é auxiliar de enfermagem. Ganha o suficiente para ajudar a família e pagar seus estudos e alguma cultura, além da planta. Mas quer ser médico. E é um sujeito bastante dedicado. Paulo não se sente controverso. Diz que o fumo é coisa natural. Mas só ele pensa assim naquela rua... Rua de gente correta, que obedece a lei, essa gente de bem."

"Espionagem amorosa nos tempos de hoje". Ou: "A flecha do cupido é a seta do mouse".

quinta-feira, 23 de junho de 2016

Aquele lance virtual silencioso
Coisa de admirador
Ou agente secreto?
Será que é pós-moderno?
Você sabe do que estou falando...
Nestes tempos de rede social
A gente fica curtindo as fotos
Numa paquera unilateral
Passando o dedinho do mouse,
Acariciando a imagem,
Fazendo cafuné e massagem
Vai que a pessoa sente... ?
Aí digita qualquer coisa e apaga
Só para mostrar que perde palavras
Que faz escolhas estratégicas
Para enviar uma mensagem
Vai que a pessoa nota?
E desenrola aquele "agora diz"...
A telepaixão, às vezes, para ocorrer
Só precisa de um clique do acaso!
E a gente ri - o coração é bobo.
É gostoso amar em imaginário,
Ficar se declarando para a tela
Delirar um "se você topar eu caso".
Quem precisa conhecer o outro?
É isso que quase nunca dá certo!
... Mas a gente não diz nada, claro...
Geralmente o melhor amar é o secreto!

1

quarta-feira, 22 de junho de 2016

Existir é um incêndio de querer as
Duas metades e só poder morder uma,
Porque as duas são a mesma.

Bocavento

terça-feira, 21 de junho de 2016

O céu da cidade agora é sempre cinza
nunca mais saiu o sol, desde que
Tito Manja-Léguas! Famoso Bocavento...
Pássaro caminheiro entre os homens
Passou  a contemplar a cidade
de cima dos prédios
Tocando sua gaita ininterruptamente
Mas ninguém sabia o porquê.
É que Tito escondia um segredo:
Prestidigitador do vento,
Fazia música para deprimir seus males
Assim seus demônios sentavam tristes
Encantados com o outono e as árvores
E ouviam seu canto sem nada dizer...

A Brasília que ninguém vê

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Passo o tempo por entre vias
Entrequadras, entre passos e vento
Além da cidade antecipada
Do olhar vazio voando baixo
Nos bosques de pedras e gentes...
A Brasília que ninguém vê
São os amigos perdidos, distantes,
Ausentes...

Perder-se, sem deixar de saber onde está

domingo, 19 de junho de 2016

Quase nunca escrevo sobre mim, muito embora haja quase sempre muito de mim no que escrevo. Para escrever, eu medito alucinadamente: é um transe poético. O poeta vive o sonho, ele não é quem é, nem é o que escreve. É um mensageiro. A maioria dos pensamentos é que me encontram, quando não me dito. Muitas vezes acabo sendo outra mente, em algum outro lugar ou tempo neste ou noutro planeta... Eu vivo outra vida, para não virar um museu... Essa é a poesia, a palavra pupação em movimento perene. O poema é um mapa para chegar ali. Mas não existem direções definidas, então... Cada cabeça lê o mapoema de uma forma diferente... A labuta é escrever um mapa que todos possam ler de qualquer forma e sempre dê em poesia. Por isso, ser um só não basta. Por vezes pode soar controverso, confuso, estranho, mas isso só ocorre se se ignorar a licença poética e a existência do eu lírico... A labuta de quem lê é perder-se no poema, sem deixar de saber onde está.

Natural

sábado, 18 de junho de 2016

O laboratório não vende a substância
A substância a natureza esbanja
O que o laboratório vende é o saber
Saber separar o ativo
Da planta
Para compor a pílula
A pílula tem estatísticas
Não sempre
Mas eu desconfio dos números
Mais que das aromáticas respostas
Se a incerteza é fria
A minha intuição não falha
Natureza é fonte
Medicina é Gaia.

Endereço

sexta-feira, 17 de junho de 2016

Quando alguém diz: "o amor está morrendo"
Não é com o amor que fico surpreso
Não sou inquilino da razão, mas veja bem
Amor não morre
Ele só muda de endereço
Ainda que demore.

Fonte

quinta-feira, 16 de junho de 2016

Meditação não é medicação...
Mas para a mente, qual é a diferença?
Placebo existe, o poder opera, a auto-sugestão transforma.
Às vezes o amor é melhor que o remédio...
Às vezes é um tédio o nosso maior inimigo
E não o vírus. Mas o emprego, a solidão
O cansaço, o abate, a falta de brio... Tudo isso também é placebo
Só que ao contrário: é o botão da auto-destruição...
Não adianta tratar sua doença
Se você não elimina a causa dela
Nem sempre o problema está onde você vê
Você olha a sombra-efeito, olha o defeito
Mas devia buscar sua causa-fonte
Olhe adiante... O horizonte só existe em você.

Passarinhos andarilhos

quarta-feira, 15 de junho de 2016

Sete crianças desciam nove ruas farejando frescor matinal
Musicalidade
Por cada poro do corpo, da alma e da mente
Bebiam lucidamente atmosfera, bichos, relva
Em passos de dança de partículas
Para todas as direções
Faziam reverência ao nada, sorridentes e plenas de espírito
- Em respeito à natureza -
Absorveram numa trilha mais fechada
Caminhando em transe, levemente
Meditando os movimentos, a jornada
Até chegarem à clareira do bosque
Um subterfúgio de passarinhos andarilhos
Que não podendo caminhar na via láctea
Deitam-se como as árvores do caminho
Para que a galáxia passeie dentro deles...

A professora de levitação

terça-feira, 14 de junho de 2016

Minha professora de levitação é a maior figura! Na aula de hoje, levou uma bicicleta! Com rodas. Sim, é que achamos estranho, afinal, é a terceira aula e nada de sair voando por aí. Mas a mestra é dessas almas que, quando falam, encantam como água e estrelas. Ela explicou calmamente que ninguém levita do nada! É preciso ir tomando gosto aos poucos, senão o pé não sai do chão. No começo eu não entendi bem, mas então foi minha vez de pedalar. Fiz como ensinou a professora, fui pegando gosto pelo vento. Atravessei as paisagens noturnas feito um pássaro! Um pássaro com rodas, sim, mas eu pude sentir, por alguns instantes... A ventania... Corria e ela me abraçava, pegando carona comigo. E eu descobri: ela é que ensina a gente a voar. A gente vai se gostando, ela começa passando a mão no nosso rosto. Depois, os cabelos alucinam num rock'n roll de dedos-brisas, carícias, rajadas... Então eu pedalei mais forte, quis liberdade, abri os braços e, de repente, uma capivara! MERDA!

Tropecei as intenções. Finalmente saí voando, porém não da forma como eu queria. Foi emocionante, já que eu fiquei com mais medo de morrer de susto da capivara que da queda e, tendo sobrevivido às duas coisas, me senti triplamente vitorioso (a terceira conquista foi aprender a lição do dia). Voltei rindo, todo sujo e arrebentado, carregando a bicicleta que, por sorte, ficou intacta! A professora me perguntou o que eu tinha entendido do exercício. Respondi que, na vida, quem não pedala com vontade vira capivara, que é um bicho horripilante no escuro, sobretudo para quem pedala ambiciosamente. A mestra derramou uma sonora gargalhada, mas sabia que o exercício havia sido um sucesso! Voar pode levar ainda um tempo, entretanto já percebi que o segredo está no sentimento cultivado. Por um instante, foi tão bom sentir a brisa soprando meu rosto que, vivendo aquele momento, amando-a, tornei-me leve e cheio de vida... Isso é levitar por dentro e, se a gente aprende a levitar por dentro, nem precisa levitar por fora, porque a grandiosidade do ato é a mesma.

Olhos e ouvidos

segunda-feira, 13 de junho de 2016

Ah, vozes do mundo
coro da natureza circundante
amigos, irmãos, parentes distantes...
deixem-me só.
deixem-me ausente.

Esqueçam-se de quem fui
pois eu já não sou senão dúvidas...
nada tenho a oferecer
não lhes sei o que dizer
eu só sei calar-me em bobos risos

Quero ouvir apenas o sol
efervescendo vida
daqui, das nuvens escuras e frias
topo da montanha que me escalei
e nada encontrei, senão silêncios.

Tenho saudades do que nunca veio
sinto tanta falta de tudo que perdi
que já não sei o que ganho
em minhas mãos nada guardei
exceto meus olhos e ouvidos...

Cabe no bolso do mágico

domingo, 12 de junho de 2016

A linha segue intacta
pronunciada pelos tudos
os todos.
Pelas luzes desenhada
na proporção de uma ideia
fosca, alheia
Negociando um torpor
factual
portátil
cabe no bolso do mágico
mas nunca se esgota em
mero episódio isolado

A luz-linha é um acaso
forçado.

Paisagens

sábado, 11 de junho de 2016

Quando me olho espelhado, quem eu sou?
O reflexo tardio
A face de um lago
Ou as imagens se olhando somos um todo maior?

Há muito mais...

sexta-feira, 10 de junho de 2016

Há muito mais do que o que se manifesta através do comportamento do ser. A raiz, o próprio SER, é algo que flui por entre as informações, identificando-se, realizando a si, contudo, esse SI é algo maior, outro resultado da natureza do universo, não condicionado ao comportamento, mas vivenciando-se através deste último.

O engano está em assumir que o comportamento é a identidade absoluta do ser, aprisionando-o, destarte, numa imagem historicamente situada, quando, na verdade, o ser pode deliberadamente não ser. É a liberdade sem rosto da consciência (o tal do livre-arbítrio) que fundamenta a experiência individual do organismo consciente.

A própria constituição do tecido existencial só é possível graças às intermináveis combinações entre as informações que o compõem, mas como julgar a natureza do universo a partir de suas manifestações? Contemplo, admirado, toda a resplandecente manobra do ocaso, contemplo tudo, todavia resta a questão: quem vestiu os meus olhos para saber-me?

Ninguém andou por sobre minha pele, ninguém sentiu este ponto no espaço-tempo. Quem pode julgar-me? Como posso julgá-los? Não vivo para sobreviver, eu não quero lutar, eu quero o tempo, o bom tempo, a raiz, o tronco, as folhas e o vento. Ouvir as paisagens em que este ponto autoconsciente existe, é isso que me importa: a árvore!

Duas flores

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Havia duas benditas flores na porta da minha casa! Quem as teria deixado ali? E por que razão? Pobres das flores (foi o que pensei de imediato) arrancadas de sua suprema e breve fórmula de viver... Todavia, querendo crer no bem por detrás deste sinal, precisei de seguir uma hipótese solutiva apressadamente e, na falta de algo mais elaborado, conduzi-me a refletir acerca de uma possível boa intenção motivando este aromático sacrifício! Doce perfume, a ilusão. Nada mais tolo que tal degenerado eco de gestos prontos, baratos! Duvidei das duas flores. Duvidei de mim, também, afinal, quem quer sempre agir é o mistério intermitente, eu posso ser apenas um sonho das plantas, assim como as flores.

Não me foi possível elaborar uma resposta definitiva sobre a motivação essencial desta situação, contudo é curioso constatar que, por mais que queira eu encontrar formas de repensar minha reação diante das tão delicadas presenças florais, o encanto que as permeia é avassalador... Penso mais em coisas agradáveis que desagradáveis, quando contemplo a perfeição natural das pétalas e sua diminuta preocupação com a longevidade. Este pensamento igualmente não durou mais que sua própria beleza e minguou. Isso porque agora talvez eu tenha compreendido algo para além do imediato: nunca importa quem nos traz flores, mas o que temos dentro de nós e que é capaz de reparar não no que vivenciamos, mas no que é vivenciado por outrem.

Luta

quarta-feira, 8 de junho de 2016

A vida está pronta para presentear os audazes
Quem clama
Os que se esquivam lutam consigo próprios
Quem chama
Somente os fracos se tornam fortes...

Correnteza

terça-feira, 7 de junho de 2016

Todos querem falar em culpa
Eu não os culpo se gritam ou sussurram isso
São apenas desculpas reconfortantes
Eu não nos vejo cientes, empoderados
Eu vejo cinzas... provocadas pelo fogo
À mercê do ar, destinadas a nutrir a terra
Bocas, numa íntima conversa entre fenômenos
Poderia não ser assim?
Poderíamos, de fato, ter poder sobre nossas vidas?
Quanta grandeza sentimos? Quantas realizamos?
Somos falhos?
Acenamos com a bandeira do orgulho
Passeia de mão em mão nosso melhor legado
Sorrimos, confusos diante uns dos outros
Desejamos a tempestade, mas nós a somos e passamos
Espera-se que todos saibam sempre fazer o seu melhor
"É sua história aqui, sua existência! Queime tudo!", dizem
Mas o sangue esfria e a chuva cai sem nada de especial
Isso é falta de poesia
Não há culpados, o que há é quem culpe!
E isso é falta de consciência
Não de capacidades
Esse olhar para x e não para y é nossa realidade
Somos um sonho com pernas, mas nossa vida desperta
É uma busca por asas
E quando voamos, queremos nadar
E quando nadamos, queremos culpar alguém
Porque não voamos
Nós não vemos a pessoa, vemos nossas ideias sobre ela
Sobre nós mesmos...
Sobre o que "aprendemos" a pensar?
Pensar não é um ato estático, condicioná-lo é insanidade!
Questiono o momento que sou, porém não ouso culpar-me
Meus limites nunca foram para os de fora não entrarem
Eles apenas me aprisionaram em ideias que guardei
E eu posso ver além disso, eu posso sentir, eu sei
Este momento em que somos é tão vastamente complexo
Tudo é tão profunda e perfeitamente costurado
Maravilho-me diante do momento
Como posso perder meu tempo buscando desculpas
Não me culpo, ocupo. Ocupo o espaço de minha identidade
Nada está sob controle! Viver não tem mapas!
Sou porque o mundo me é sem aspas
Eu não sigo a correnteza, eu a sou
Compreender este aqui é, talvez, o maior dos passos
Não se dança conforme a música, mas conforme o ritmo
O ritmo é resultado do mundo
Ou o mundo é resultado do ritmo?
Cabe apenas a você decidir
Mas decida apenas por si mesmo
Não é um espelho, nem a luz, nem a visão
Não há somente uma causa para o reflexo
Nem somente um efeito.
Olha direito.

A poesia

segunda-feira, 6 de junho de 2016

A poesia não é a cadeira de balanço da consciência
É a árvore intacta, plena de possibilidades
Árvore professora, mestra natureza, universidade transubstancial
O poeta não corta a árvore para dela se servir
O poeta sabe que a árvore é um ser magnífico
O que encanta o poeta é a beleza inerente e a inteligência da semente
Linhas e cores
Quando a vida é mais fresca à sombra de uma árvore
Quando o vento alucina as folhas
Quando o fruto está maduro
Tudo isso, o aroma intrínseco, a vida harmônica
É natural o sonho do poeta
A poesia não é a cadeira de balanço da consciência
É a árvore intacta, universidade transubstancial...

Leve

domingo, 5 de junho de 2016

Eu não sou o tipo de pessoa que fica "pisando em ovos". Eu não estou nem aí para o seu conceito de certo ou errado, ordem ou desordem, importante ou banal... Para mim, você não sabe de nada! Só o que te sobrou do que veio de fora. Mas por dentro, o que é que você oferece a partir daí? Ovos, talvez... Algo quebrantável, cascas, vida... Você oferece a própria vida ao tempo, ao existir, a troco de quê, mesmo? Ovos, talvez, algo insustentável! Útil, quem sabe bom, às vezes, mas pouco, sozinho. Já eu... Eu sobrevoo as cascas, orbito a dúvida, não creio em lógicas só porque fazem sentido, eu quebro a cara... Aprendo o mundo como quem examina universalidades, eu não busco agradar quem quer que seja, eu sou o seja, o resto é o faça-se e, no centro, há a terra, a extensão viva de sonhares, o planeta rodopiando os seres, deixando-os confusos, trocando os olhares, tentando entender... E eu ali, assistindo tudo e aprendendo a viver-me mais que pensar-me, no bem. Eu sou o tipo de pessoa que gosta de pisar o pé no chão, sabendo que está voando no meio do espaço... Afinal, na esfera existencial, todo ponto é um centro, inclusive o ovo pode ser o centro do universo, mas esse papo não é novo. Importante é você saber: tudo se vive interiormente, então repense (com poesia) as paisagens que te habitam o ser. Te sobrevoo o ter. Choque teus ovos. Cheque teu ver. Eu piso firme... Feito a luz do amanhecer. 

Do Centro

sábado, 4 de junho de 2016

A única coisa que permanece é a mudança
O mesmo brilho que me alumia os passos pode me cegar
Quando falo de mim, não estou falando de alguém
O único Deus que posso ver é o mundo
Cada erro é um desvio para fora de mim
A vontade pode (ou não) ser sua própria extinção
Quando falo de paz, não é de mim que falo
A mesma vida divide a substância-corpo existencial
A vontade presencia os fatos, crê nas regras
Cada caminho é um caminho para dentro de mim

As Árvores

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Contei às árvores que também sou a noite. "Então mostre-nos suas estrelas", ela suplicaram-me. E eu lhes disse: "eu sou a noite, não o sonho que a habita".

O Livro do Mundo

quinta-feira, 2 de junho de 2016

A Natureza é nossa primeira e grande mestra, nossa professora... Somos resultantes dos processos da Natureza e nela podemos encontrar reflexos do inominável em nós. Todo o nosso conhecimento, nossa saúde, nosso existir, tudo isso faz parte do banquete servido pela Natureza... Nós não somos seus hóspedes, somos seus filhos - compartilhamos muito mais que sua substância.

Não somos irmãos? Não somos fruto da ação do cosmos no espaço-tempo Terra?

Está diante de nós: o livro do mundo só não lê quem não quer!

Mas eu me encanto.
Eu amo seguir o rumo de um ramo
e ver no que árvores, que jardim,
tudo se dará, as profecias climáticas,
as vivências metafísicas,
toda a orquestra de falhas não fará mais sentido,
nós não mais tocaremos sons,
nós tocaremos nossas almas...

Estrelas ao Contrário

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Passei mal em plena rua. Ninguém me ajudou. Minha visão estava turva, eu cambaleava, pedindo ajuda, mas nada. Todos tão ocupados e eu sozinho na calçada perdendo consciência. Primeiro perdi a razão. Não podia me queixar, afinal, quem é que sabe de alguma coisa? Dava na mesma, mas... Ainda pensando assim eu perdi o equilíbrio e exagerei uma translação ao redor de mim mesmo, eu me orbitava e tropecei numa placa. Caí, tentando segurar alguma imagem do que sobrava de quem eu era, todas derramaram... A sociedade foi-me chovendo decadências, "estrelas ao contrário", alguém me sussurrava e eu não entendi. Perdi a identidade, perdi a noção. Não havia a quem recorrer, eu já não era ninguém. Anoiteci na rua, quase congelei. O tempo passou sem que eu notasse e, quando emagreci, quando eu não tinha nada, quando eu morri... Tiraram uma foto minha. O vivo enoja, enjoa, dá asco! O morto é coisa, é fácil. Coisa pode virar arte. Gente só pode ser arte se for gente ou coisa. Mas vivo eu era indigesto, eu era indigente.
Copyright 2016 . Ronan Cardoso